quarta-feira, 14 de abril de 2010

Uma questão de energia


Essa semana meu carrinho resolveu dar problema... Tem mês que sou eu, tem mês que são os gatos, e tem outros que é o carro. Nunca estamos livres disso, sempre vai ter alguma pedrinha dentro do sapato. E é mensal. Uma maravilha! A massoterapeuta disso que problemas sempre teremos, o lance é saber lidar com eles: ou arrancamos os cabelos a cada contra-tempo, ou encaramos com tranquilidade (racionalidade, disse ela) e sorriso irônico. Eu confesso que oscilo entre uma e outra, mas quando acumalam-se os imprevistos, eu puxo a cordinha do f...-se e jogo pro universo. E é aí que vejo ou escuto as coisas mais interessantes.
Lá fui eu cedinho levar o carro, pro menino ver se tinha saído toda a ferrugem do bloco do motor (a água do radiador estava amarela). Fora isso, tive um vazamento na caixa de marcha, problema rapidamente resolvido (e pago)! O ácido que eles colocaram terminou de furar a mangueira que já tinha sido levemente comida pela correia do ar-condicionado. Resolveram colocar o ácido come-ferrugem de novo. Ai, Henrique, esse troço vai comer todo o meu carro. Que nada, ele só come ferrugem, fica tranquila.
Enquanto o mecânico terminava de ajustar o carro e esperava o ventilador acionar, o Henrique, dono da oficina, comeceu a falar enfaticamente sobre os prédios que cresciam ao redor de sua oficina. Do problema da água que aquilo causara. A poluição do lençol fréatico de Capim Macio. Da falta de consciência dos ricos. Do governo colocando a culpa nos pobres. Falou em Dubai e suas construções homéricas. "Sabe por que eles estão torrando toda a grana do petróleo? Por que esse tipo de energia está acabando, é uma porcaria! Pagamos muito caro para perfurar, extrair, etc. Os carros são mais caros por causa das substânicias necessárias para neutralizar a fumaça. Aqui no Brasil a gente podia estar investindo na energia solar e eólica. Os carros seriam mais baratos e leves, e vocês mesma poderia recarregar seu carro numa grande bateria (energia solar). Outra coisa é pedir pra gente que é pobre a ter mais consciência. Não gastar tanta água. Pode? Eu passo o dia todo aqui trabalhando, aí chego em casa e tenho que tomar um banho de menos de 10 minutos? Enquanto isso a madame liga um dia antes de chegar no hotel e pede pra eles esvaziarem a piscina com cloro e encher de novo só com água, porque o cloro estraga o cabelo dela... Ou então a indústria de ferro que gasta água que só a bixiga pra esfriar o ferro, e estocam esse ferro, porque nem tá tendo saída. Imagina pedir pra eles pararem de produzir, pra produzir só o que o mercado demanda? Nunca. Aí nós é que temos que tomar banho rápido? Eu não, trabalho pra isso, pago minha água, tomo um banhão de 20 minutos. Sabe, a gente tá alimentando um bando de gulosos, circulando com esses caminhões podres que nem carburador têm, soltando fumaça e poluindo o ar. O trem, por exemplo, é o melhor para transporte de cargas. Mas não, quem ganha dinheiro com isso não quer abrir mão. E esses prédios (apontando para o prédio em frente)? sabe que os traficantes se enfiam todos aí nesses prédios. Você já viu a polícia fazendo batida em prédio assim? O traficante compra um pra ele, no nome dele, claro, e outro, onde ele põe as coisas que não prestam, no nome de um laranja. Aí, nunca que alguém pega ele! Fora isso, pra que esses prédios tão altos? Antes, quando cheguei aqui, uns 20 anos atrás, só podia construir prédio baixinho..." Aí eu perguntei pra ele como é que a cidade fazia pra crescer, se não fosse pra cima. Ele se exaltou e disse: " Crescer? Tem que crescer pros lados, tá cheio de lugar aí pra se crescer. Por que esse povo não vai pra Japecanga??? Não, as pessoas gostam é de morar tumultuadas, aglomeradas, feito pombos!"
Depois dessa, o ventilador começou a rodar e eu fui embora. Deu vontade de dividir com vocês um resumo das teorias do mecânico. Ele falou muito, mas a memória não ajuda... Acho que esse cara entende muito dos problemas do mundo, melhor do que um monte de pessoas reunidas, em volta de uma mesa, criando teorias; porque ele vive o dia-a-dia, e não supõe as dificuldades, vive dentro delas.

2 comentários:

garuda disse...

Esse Henrique foi um suiço em outra encarnação e por azar nasceu no Brasil, pra pagar os pecados de Calvin.

Ana Luísa disse...

Essas discussões sustentáveis fizeram meus quase três anos de universidade passarem diante dos meus olhos...

Ça va, Odara? :)