quarta-feira, 8 de julho de 2015

Que viagem!

Fico ansiosa quando decido viajar. Decidir é fácil. Depois vem a parte estressante: a busca pelo voo perfeito, a reserva de um lugar maravilhoso, gastar menos grana possível, tornar a viagem agradável para todos que vão comigo. Isso me dá uma ansiedade GIGANTE. Depois que está tudo organizado, fico na expectativa do dia D. Percebo logo que todo o planejamento escorre feito água ralo afora e nada sai como pensei. Então, pergunto: Por que planejar? 
Poderia pensar a mesma coisa para a preparação de uma aula. Como ensino Didática na universidade sempre friso a importância de um bom planejamento, mesmo sabendo que aquele documento, fruto de algum tempo reflexivo e de pesquisa minuciosa, não passa do esboço de um futuro improvável. As coisa nunca saem tal qual planejamos. E isso cabe perfeitamente para uma viagem, assim como para tudo na vida. Por que eu surto? 
Tenho receio de beber o rio da vida e ele não sair obviamente como planejado; flutuo sobre ele tentando encontrar um lugar onde molhar os pés, mas não tenho coragem. O que fiz até hoje foi me agarrar nas coisas que tenho certeza: estudar sempre, juntar gatos, cultivar a família. 
Observei  a vida toda meus pais arriscarem novos caminhos incertos e alcançarem júbilo e sucesso. Teria eu essa coragem? Não sei. Sempre quis controlar. Em alguns âmbitos, até que sou eficaz; em outros, nem me arrisco, fico de fora vendo a vida passar. De medo em medo as histórias não acontecem. Na viagem é onde eu encontro liberdade de ser sem medo, afinal, é a vida entre parênteses, onde tudo pode acontecer, ou nada, não importa, só sei que naquele hiato maravilhoso perco a ilusão do controle e me jogo pro que tiver de ser.
Minha busca é ser assim no cotidiano, mas como ? 
O simples fato de perceber que estou começando a gostar de alguém já me parece errado. Não me reconheço, me sinto vulnerável.

domingo, 25 de maio de 2014

Qual cheiro tem o seu céu?



Sabe aquelas noites que você não espera nada? 
Só queria sair, dar uma volta. Pintou um convite. Legal. Foi sozinha pro bairro onde funcionam diversas casas de shows e boates. Combinou chegar as vinte horas e chegou. Os amigos chegaram uma hora depois. Não se importou. Ficou lá, do lado de fora do samba, conversando com o cara que lhe vendera a cerveja e o cigarro. Conversa vai, conversa vem. Ele pediu pra ela cuidar do carrinho dele. Ficou sentada num banquinho improvisado pastorando a cerveja do moço. Quando ele voltou, um pessoal foi se achegando e um maroto perguntou: "Quantas você já vendeu?". "Por enquanto, estou só comprando.", foi sua resposta. "Não seja por isso, o que você quer beber, eu compro de você".
Tomaram uma cerveja do lado de fora esperando ainda seus amigos. Pelo r carregado soube logo que era carioca, daqueles da gema. Ele ficou com ela até os amigos dela chegarem, entrou com eles, encontrou seus amigos já lá dentro e colocou todo mundo junto em volta de uma mesa. Agrupou o pessoal. Quando menos espera, o tal a tira pra dançar, samba a dois! Como assim? E quando deu por si, já estava rodopiando pelo salão. Como dançou naquela noite sem promessas! Além de dançar, ria. Não cabia em si. Há quanto tempo não dançava. Que delícia! Dançar é, definitivamente, uma porta para a felicidade. Para coroar a noite, ele pergunta assim de supetão: "Qual cheiro tem seu céu?". E aquilo soou tão Marguerite Duras que ficou sem palavras. Como pode?

O céu dele tem cheiro de corrida na praia de manhã cedo. De mergulho com arpão pra caçar o peixe que vai assar na fogueira. De cochilar de tarde na rede e fazer amor vendo o sol se por. 

Até agora, não sabe o cheiro do seu céu... Se Duras brinca com nossos sentidos, principalmente no cinema, querendo que ouçamos as imagens e vejamos os sons, lhe parece muito peculiar essa ideia do céu ter um cheiro, cheiro seu, particular. 

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Meu céu tem cheiro de liberdade, de horizonte à vista, de mar azul e clima quente. Meu céu tem cheiro de gato e chamego, de amor, de família, de horta e terra molhada. Tem cheiro de mato e caminhada na trilha. Meu céu tem cheiro de trabalho feito com paixão, criatividade e responsabilidade. Meu céu é um cavalo a galope com cheiro selvagem e forte. O cheiro que quero é de boas lembranças e de coisas novas, gostosas e felizes. Meu céu tem cheiro de água e vento,  de lenha queimando e panela fervendo. Gosto de cheiro de biblioteca, daquelas que ocupam todas as paredes com uma espreguiçadeira no meio e uma luminária bem elegante e eficiente. Meu céu tem cheiro de risada e música boa. No meu céu tem silêncio.

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Te amo, te odeio

Calo a boca, fico em silêncio.
Não consigo dizer o quanto te amo e te odeio, quase ao mesmo tempo.
Enroscada a você, a noite me penetra.
O dia contudo me traz a punhalada do desprezo.
Presente você é, quando presente.
Quando longe, deixa de existir, desaparece.
Não se importa, ocupado demais com seu umbigo.
Sempre pronto a ajudar quando requerido.
Se não pedem, não levanta um dedo.
Deixa a vida se encarregar de tudo, lentamente.
Nenhuma atitude. Sabe esperar e o devagar é quase sempre.
Ao contrário de você sou eu. O oposto atrai?
Senti um amargo estes dias, como vai, dormiu bem?
Dormi. Ponto final.
Nada.
É chocante, dá uma revolta. Parece desconsideração.
É seu jeito. Curto e grosso.
Mesmo assim não me conformo.
Então porque insistir no que não me faz bem?
No que você deixa o tempo levar eu quero controlar.
Quero presença, mesmo ausente.
Você é um vazio, inexistente.
Já senti saudade.
As vezes penso; cada vez menos.




domingo, 14 de abril de 2013

Por que não?


Até onde vai a minha racionalidade? Vermelha pulsação tange a massa cinza. Certamente vai além dessa dicotomia. A razão se vai a noite e volta pela manhã com gosto de guarda-chuva e estrelinhas nos olhos. O que é isso gente? Toda noite isso, por que controlar o que eu não quero controlar? Eu gostaria de fazer, mas talvez não deva. Consequências pairam sobre minha cabeça.

Racionais e controladas são as pessoas. No entanto, acredito que no âmago todos somos loucos, cheios de vontades e curiosidades soterradas violentamente pelos dogmas morais e éticos, e a tão idolatrada razão.

Gosto de simplicidade, inocência. Quando o corpo pede, por que não dizer: “sim”? Porque isso é errado, não pode, é feio. Poxa! Mas não tem problema nenhum. As vezes me passa pela cabeça que ser inocente, ingênuo, viver sem escudos é algo terrível, pois más intenções podem me assolar. Quais são as suas intenções? Nunca saberei senão o tempo. Mas o tempo passando eu não vou ficar sentada em uma cadeira diante da janela assistindo o vento açoitar nuvens. Enquanto o tempo passa tenho que ir vivendo e experimentando mesmo se for para tatear as paredes dessa casa até achar um interruptor. Se achar. Como viver de outra forma? Vivemos perigosamente. Como diz Riobaldo em Grande Sertão, “Viver é muito perigoso... Porque aprender a viver é que é o viver mesmo... Travessia perigosa, mas é a da vida. Sertão que se alteia e abaixa... O mais difícil não é um ser bom e proceder honesto, dificultoso mesmo, é um saber definido o que quer, e ter o poder de ir até o rabo da palavra.” Gênio Rosa.

Quem é que vai? Eu não sei. Não exatamente. Experimentos. Sinalizar o que quero. Como? Se não sei. Não dou, não vejo. Iluminados dias de flores coloridas; uma sombra cobre a gente feito nuvem carregada de chuva. Como faz frio de vez em quando. Quentura danada desse inferno terrestre. Deus existe! Se existe? Como ficar parada diante do movimento do mundo? De pé menina que a terra não para de girar por sua causa! Levanta e sacode a poeira, música boa essa, levanta defunto. Dores e amores. Doce amora. Vam'bora! já sei o que quero: cerejeiras em flor.


sexta-feira, 29 de março de 2013

Deste ano eu não passo! (um minuto)


Deste ano eu não passo! Minha cabeça está girando, ou melhor, o mundo está girando em volta de mim. Me segura que eu não quero cair de cara. Já pensou? Uma velha assim, estatelada no chão? Não dá, por isso que eu não saio. Piscina nem pensar. Aquele chão escorregadio... Você é nova, cheia de saúde e energia. Eu sou doente. Mas vó, o que é que você tem? Como assim o que eu tenho??? Você me faz cada pergunta! Estou velha! Dói tudo, tenho medo de cair e a depressão... Eu tenho depressão sim! Você acha que é mentira, não é não! Então vamos dar uma volta pra ver se você dá uma levantada. Não. Quero ficar aqui no meu canto. Outro dia eu vou. Outro dia é muito longe vó. Hoje não quero, estou com gripe, atchim!

E por aí vai um discurso que por vezes me deixa triste, outras, me faz rir. O que é viver senão um momento? A cada segundo de vida tudo pode acontecer. Quem sabe a vontade dela de ir embora não venha mesmo este ano e aí, fim. Se resguardou tanto com medo de morrer querendo a morte. É contraditório. É. Por vezes estamos tão adestrados ao nosso cotidiano que não percebemos os momentos. Um riso aqui, uma conversa aparentemente sem importância acolá. Pintar o sete!

Eu adormeço ao tic tac das horas, cumpro meus deveres como cidadã, respeito as regras sociais, morais e éticas. O compasso do tempo me embala num ir e vir, do trabalho pra casa, da casa pro trabalho. Uma corrida aqui, um copo de vinho acolá. Estuda, estuda, estuda sem parar. E podem me perguntar onde ficam os momentos nesta história banal de vida adulta? Eu acredito que o momento está na meninice. Ter a criança dentro de mim. Cliché, sim. Quando penso nos meus aprontos, fugindo um pouco destas regras taxativas, sorrio feliz de ter em mim aquela que já fez muita coisa "errada". Prometo, não prejudico ninguém. Fujo apenas, só um pouquinho, das amarras impostas e me sinto viva, mais viva! quando faço uma destas brincadeiras com gosto de coisa errada, mas que na verdade não têm nada de mais.

Até agora rio de correnteza. Escuridão de luz. Um oceano de palavras, tão belas, tão fracas. Ó vida de banho de mar. A lua espia o dia. Ventamos alegria. O tempo voou, e veio me dizendo que é pra eu continuar a achar. E achando ir vivendo de novos banhos de luar.

A lua de ontem me deixou completamente apaixonada. 

quinta-feira, 28 de março de 2013

A lua


Li está frase hoje no livro Ravissement de Lol V. Stein de Marguerite Duras e como ela se encaixou bem a nossa belíssima noite de hoje: 

"l'étandard blanc des amants dans leur premier voyage flotte toujours sur la ville obscurcie."
(tradução literal: o estandarte branco dos amantes em sua primeira viagem continua a voar sobre a cidade escurecida) 
Por Raoni Kunkler

Alguém acompanhou a lua crescente estes últimos dias? Majestosa, flutuando no céu anuviado, da mesma forma como ela muda as marés, ela também me transforma. 

Lá vai ela, alta no céu agora, tive a sorte de dar com ela ainda perto do horizonte. Assisti seu movimento ascendente de dentro d'água, hipnotizada. Tenho duas opções: acreditar ou não na magia da lua, na sua influência, assim como a de outros planetas sobre minha pessoa e sobre o mundo. Prefiro acreditar e observar. 

Boiando, fiquei cara a cara com o universo. Contei estrelas. Vi nuvens passarem açoitadas pelo senhor vento. E ela, estandarte branco dos amantes, iluminou a minha noite. Boa noite. 

domingo, 30 de setembro de 2012

Novo mundo colorido

Ela sentia-se, naquela manhã de quinta, estranhamente atraída pelo ator. O mundo artístico sempre a encantou, nunca sentiu-se inteiramente parte dele, mas sempre gostou de ali estar de alguma forma. Não sabia muito bem o que era, misto de curiosidade e engano. Obssessiva, pensa nele, para não pensar no fim do mundo.

A vida coloriu-se com esse novo mundo que se apresentou diante dela; já faz um ano que se cruzam nos corredores da biblioteca, mas foi depois de começarem a fazer um trabalho juntos que ela o percebeu. Um mundo alegre, risonho, estressado e falante que chegou chegando, sem saber que mexeria com a imaginação dela. Quem poderia imaginar: ela sempre na dela, séria e calada. Pensou-se até que era antipática, grosseira. A cada encontro, foram se aproximando. A vontade de tocá-lo a surpreendeu. Apenas roçar-lhe o braço, tocar suas costas num gesto de amizade, olhar nos seus olhos, rir de suas piadas. Nos dias que não se vêem, imagina o que ele faz. Será que pensa nela? O tempo corre e não pensamos em nada além de nossas vidas miudas. São tantos afazeres e nos envolvemos sempre mais.

Olharam-se, caminhavam lado a lado num corredor ilumidado pelo sol da tarde, tentou beijá-la. Ela afastou-se, encabulada. Que ousado! riu seu pensamento. Gosta do jogo da sedução, gosta de flertar, é uma brincadeira saudável. A paquera a alimenta de forma tal que se sente criança. Seu problema é quando a relação se estabiliza: ela enjoa. Num enfado monumental, quer fugir a qualquer preço e busca loucamente uma falha de carater ou de atitude para pular fora. Nem sempre consegue simplesmente sair da relação porque não quer mais. Sofre um pouco e deplora o tempo perdido. A fase da conquista é a melhor para ela. Se ao menos alguém conseguisse manter nela essa energia sempre acesa, não cansaria nunca. O grande problema está na entrega. Quando o faz, sente-se automaticamente atrelada ao sujeito como se fosse para sempre. Acorrenta-se. É uma auto-prisão. E então, queda livre; tédio e angústia até mandar tudo pelos ares. 

Teria ela algum problema psicológico? As vezes pensa em ter relacionamentos leves e livres, sem cobranças, com vários caras. Ir experimentando como certas amigas fazem. Pura diversão e prazer. Porém, quando encontra alguém por quem se interesse, aposta todas as fichas acreditando que dessa vez achou o tal, e algum tempo depois, vê que se enganou (como não?) Frustra-se. Busca, incansável, uma forma de melhorar essa dualidade que a mantém só durante a maior parte de sua vida.

Passou uma noite tranquila. Almoçou italiano e tomou quase uma garrafa de chardonnay californiano. Pensou nele. Estava tudo delicioso. Entorpecida e alegre, fumou um cigarrinho pra encerrar a refeição copiosa. Divagações passaram pela sua cabeça. Correu para a frente do computador e entrou na página de relações para olhar a vida alheia. É para isso que servem essas páginas, não? Sente uma vontade louca de  dançar. Liga o rádio e coloca um sambinha animado. Pisoteia o chão de sua sala, gira em torno de seu eixo, ri sozinha. Amanhã quero sair. Sente que a vida voltou depois de uma semana de baixo astral.
Uma nova história a anima: acaba de sair de um relacionamento longo. Passou pelo menos dois meses para conseguir realmente desfazer as amarras e agora se sente leve e com vontade de embarcar em novas histórias, conhecer pessoas, dançar. Alegrias e aventuras é o que quer. Amor, desejo, tesão: tudo num prato só.

De tarde foi para a aula de cinema. O professor a encanta pela sua calma, timidez e modo pausado de falar. Ela o deseja. Pena que o vê somente uma vez por semana. As conversas que têm são sempre boas e deixam aquela sensação de que ainda há muito mais a dizer. Quando ele se despede, sai tão rápido que mal dá pra responder o até logo. Ela não entende: ele parece interessado, mas tem horas que ela realmente não sabe: ele é distante, e não fica perto dela nos intervalos. Pode ser discrição... Sorri pensando na tarde com o professor.

Voltando para casa viu a lua nascer atrás das dunas verdejantes. Linda! O céu cor de rosa e o verde da mata contrastando. Entusiasmou-se: Vou sair, ver gente, conversar e rir. Ainda tentou se segurar, ficar em casa seria mais prudente. Mas que nada. Fez uma ligação, passou a mão na bolsa e saiu. Foi no aniversário de um boêmio. Tomou copos de cerveja e fumou cigarros. A conversa estava boa. Atenta, escuta o pessoal mais experiente do que ela. Tocou uma música de anos atrás que adora. Ela se levantou para dançar: viva a juventude! gritou o aniversariante. A festa acabou cedo. Dispensou a carona, preferiu voltar a pé. Andando pra casa, alegre, meio arrependida dos cigarros (vício maldito que nunca sairá de mim?), conversa com a lua, que já vai alta no céu marinho.