sábado, 12 de junho de 2010

Prefácio

"Casas entre bananeiras
mulheres entre laranjeiras
pomar amor cantar

Um homem vai devagar.
Um cachorro vai devagar.
Um burro vai devagar.
Devagar... as janelas olham.

Eta vida besta, meu Deus."
(C.D.A)

Não tinham nada a ver um com o outro. Seus encontros começaram num trem que ía de São Miguel à São Paulo. Ela fugira de casa: não aguentava mais aquele interior de tédio e calor de areia. Ele buscava a mulher de sua vida.
A família dela tinha boa renda, o pai tinha um armazém e a mãe trabalhava na roça. Viveu sempre dentro de casa, protegida dos perigos da vida e dos homens, sempre fechada em seu pudor. Foi nesse tempo que aprendeu a cozinhar.
Ele já enveredava nos caminhos da técnica, tinha paixão pelas tensões eletrônicas. Sua família era pobre de marré.
Quando casaram, foram viver num cortiço com banheiro comum. Era um desconforto. Mas ela aceitou sua sorte. Antes isso que apodrecer naquele fim de mundo.
Casaram-se depois de oito meses que o pai da moça havia ido buscá-la em São Paulo. A virgem prometera voltar em um mês e um ano se passara...
Logo de cara, nas diretas dele, ela disse que não o amava. Mas ele ignorou o fato, e insistiu, até ter para si o que tanto almejara: uma mulher de papel passado e anel no dedo. A noite de núpcias foi assustadora para ela. Desmaiou diante da coisa imposta pelo laço matrimonial. Nunca pensara nisso e nem imaginava o que poderia ser. Nunca se recuperou do trauma. Para ela o sexo era esdruxulo. Nunca conheceu o prazer da carne. Fazia por obrigação. E dessa obrigação teve três filhos. Todos fortes e fisicamente saudáveis.
Ela aguentava a sorte a base de calmantes. E ele pinguçava. De temperamento calmo, quando bebia, chutava o pau da barraca.
Certa vez, ela implicando com a mesa de pernas tortas, ele com algumas doses na cabeça, resolveu o problema chutando as pernas com vontade de ver o mundo abaixo. Ela balançando a cabeça negativamente. Só pode ser louco. Suportaram-se até o fim. Dele.
Ela venceu as delícias do calmante e vive até hoje.

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